quinta-feira, 25 de abril de 2013

sodade


Um poema revisitado, data original:SEGUNDA-FEIRA, 12 DE NOVEMBRO DE 2007

De manha encontrei felicidade no riso,
das pessoas que se opõem ao isolamento.
A caminho do trabalho um pequeno mito,
que alegra e rodeia o sofrimento.

Há uma pessoa ao riso alheia
escorregou ao largo do poço.
Metade escuro, metade chuvoso
ainda cai uma pequena candeia.

Um filho de escravo desposado
que da terra mãe partiu
sentiu a sodade ao lado
o cheiro da roça ouviu,

Surge agora uma lembrança
de algumas dores que já extinguiu.
No passado havia uma dança
que o futuro nunca mais pediu,

foram estalidos na distância
combalidos agarrados á ferida
uma dor que já não pede vingança
um sentimento guardado na bebida..

Agora o comboio assobia
e o corpo ainda se arrepia
quando uma mala no chão duro
explode o tímpano infortuno…

...

-Compatriotas, que saudade!
-Mas entre nós não há amizade.
-Lembram-se do carro de bois?
do calor antes da tempestade?
-Surge agora uma igualdade,
mas não interessa quem vós sois.

-Que solidão é esta que canta
tão perto do meu pensamento
porque é que sei que não adianta
procurar novo sentimento...

Segue só para a sua luta
ainda tão acompanhado
pelo zumbido da bala,
parte o coração congelado.

Se alguma coisa a vida ensinou
foi que é uma história continuada
mas se chorar nunca ajudou,
também não lhe ajuda a espada..

com esta quadra presente
arrastou o corpo da cadeira
levantou a alma assente,
fechou mais uma ratoeira.

Parou a carruagem
e abriu-se a porta
encheu se na coragem
de consciência morta...

Vi-lhe o rosto desaparecer
numa multidão como ele
não sei do triste ser
mas há esperança nele...

sábado, 20 de abril de 2013

3 Poemas de Carlos Marighella


Liberdade

Não ficarei tão só no campo da arte,
e, ânimo firme, sobranceiro e forte,
tudo farei por ti para exaltar-te,
serenamente, alheio à própria sorte.

Para que eu possa um dia contemplar-te
dominadora, em férvido transporte,
direi que és bela e pura em toda parte,
por maior risco em que essa audácia importe.

Queira-te eu tanto, e de tal modo em suma,
que não exista força humana alguma
que esta paixão embriagadora dome.

E que eu por ti, se torturado for,
possa feliz, indiferente à dor,
morrer sorrindo a murmurar teu nome”

São Paulo, Presídio Especial, 1939
Marighella

O país de uma nota só

Não pretendo nada,
nem flores, louvores, triunfos.
nada de nada.
Somente um protesto,
uma brecha no muro,
e fazer ecoar,
com voz surda que seja,
e sem outro valor,
o que se esconde no peito,
no fundo da alma
de milhões de sufocados.
Algo por onde possa filtrar o pensamento,
a idéia que puseram no cárcere.
 
A passagem subiu,
o leite acabou,
a criança morreu,
a carne sumiu,
o IPM prendeu,
o DOPS torturou,
o deputado cedeu,
a linha dura vetou,
a censura proibiu,
o governo entregou,
o desemprego cresceu,
a carestia aumentou,
o Nordeste encolheu,
o país resvalou.

Tudo dó,
tudo dó,
tudo dó...
E em todo o país
repercute o tom
de uma nota só...
de uma nota só...

Rondó da Liberdade
É preciso não ter medo,
é preciso ter a coragem de dizer.
 
Há os que têm vocação para escravo,
mas há os escravos que se revoltam contra a escravidão.
 
Não ficar de joelhos,
que não é racional renunciar a ser livre.
Mesmo os escravos por vocação
devem ser obrigados a ser livres,
quando as algemas forem quebradas.
 
É preciso não ter medo,
é preciso ter a coragem de dizer.
O homem deve ser livre...
O amor é que não se detém ante nenhum obstáculo,
e pode mesmo existir quando não se é livre.
E no entanto ele é em si mesmo
a expressão mais elevada do que houver de mais livre
em todas as gamas do humano sentimento.
 
É preciso não ter medo,
é preciso ter a coragem de dizer.

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Caravela das serpentes


Sanguesugas desvairadas,
Serpentes enclausuradas,
na mente, desmaiadas,
perdidas,
Facas espetadas!
No coração de Deus!

.

O tronco está chorando,
a árvore eterna morrendo.
chagas já ao ritmo da serra.
semente ao ritmo da terra

Serve, servia, para alimentar...

Adeus...mas...

Olhai que o fogo ainda arde,
dentro do coração,
efervescente, vulcão,

Há-de Rebentar!

Quando rebentar,
a bolha sem compaixão,

O pobre vai gritar,
na união, Olhai, que perfeição!
Todos juntos, todos familia!
reunida
Repleta
perfeita
sempre.
como era.

O céu reposto.
O inferno enviado para as entranhas do seu ser,
o reverso da medalha, do prazer.

ENGOLÍ EM SECO, SAPOS!
GUARDANAPOS, TRAPOS!

EIDE ENCOSTÁ-LOS Á PAREDE!
RIPOSTAR!
DE VERAS!
CRUZANDO OS MÁRES.

COM AMOR, EIDE MATAR.
O ESPÍRITO PROFANO.

DIFUSO É O ENGANO.



terça-feira, 16 de abril de 2013

Ao Acordar, Acordei

Primeiro, de dourado o céu trovejou
de amor pelos campos o homem sonhou.

Segundo, o defunto moribundo,
subido aos céus na penúria do mundo.

Terceiro, o céu de vermelho pintado
com Cervantes atravancado.
Nem sancho pança nem dom quixote
nem espada nem chicote,
mas na força de mil homens concentrada,
A espada
trespassa
e repassa
o fogo de mil
emancipada,
renovada.

Cuidai,
que este é o momento,
Mágico.

Ergui-vos é vossa.

Cuidai, do espírito dos homens
e sabereis, destemido como os reis
que não há sábios por detrás das leis,
Usurpados, são os lábios das cascavéis.

submissas, rastejantes
entregam o reino ao ladrão sibilante
e voam pelos ares, voando
minorando, diminuindo.
os demais que não julgam, por baixo.

O que terá caído, justiça divina,
santa providência,
De falsos profetas repleta.

Descansai,
Juro.

Tudo passará,
Quem não teme, não tremerá.
boa vida e boa morte, segura, o terá.

O céu vingar-se-á de tamanha enxurrada.

terça-feira, 9 de abril de 2013

Bôbos da corte

Agora o manjar volta a manchar
de vermelho minha pena,
importada e de ave estrangeira,
não se vá cá cair na asneira,
de se segurar ave nossa,
como empurrar carroça,
deixá-lo para o burro que carrega tudo.
burro, por acreditar que sim.

pois então,

Gaivota vai voando
Pousa e ri esbagaçada.
maior é teu engano,
nas malhas orquestradas,

Mar, bate na rocha!
de lava cara,
guerreando,
sem nada.

Gaivota sai voando,
pela urbe lá fora.
trás notícias cantando,
pelas margens da demora.

A sua estridência!
que até pasmo cora,
é de alvoroço sachando,
o que demais, embora,
se acha de mais, e tanto!

é esgravatada...
desgrude.
esponja e emprestada.
gorgulho magnânimo.
oprimisses-nos menos.
basbaque desquebrando,
bar-ganância
reaprende,
Rasga.

Ré com vós monstros!
desafinados diabos,
mosqueteai, que ministros,
surrando besta que bacu,

Grande se apavora.
com o cantar do rei dos cacos,
sagras os que condes,
levados dos antepassados,
são mais que os estrondos.

cabeças e machadadas.

uma porção de vermelho,

e assim o festim continuou.

agora com outro mais 

mais um chegado do apelo,

sangrento

não cessa

o ruído tribal

que faminto

se alimenta de si próprio.